São Paulo
8/10/2013 às 01h00
Sem resposta do governo sobre salários, delegados ameaçam retomar paralisações na próxima semana
Eles ensaiam nova Operação Blecaute e não descartam possibilidade de uma greve geral
Na avaliação da presidente da ADPESP, governo está desrespeitando os delegados de “forma acintosa”
Arquivo Pessoal
Os delegados de Polícia Civil de São Paulo ensaiam retomar, já a partir
da próxima semana, a série de paralisações que realizaram em todo o
Estado, entre julho e setembro deste ano. A mobilização, conhecida como Operação Blecaute,
seria uma resposta ao governo estadual, que no dia 25 do mês passado,
anunciou projetos de leis prevendo reajuste salarial para a Polícia
Civil. A alegação dos delegados é de que, até agora, nada de concreto
foi apresentado, o que tem revoltado a categoria.
Em entrevista ao R7, a presidente da ADPESP
(Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo), Marilda
Aparecida Pansonato, afirmou que a situação está provocando “desgaste e
desconfiança”.
— Em um primeiro momento, houve essa “disposição” do governo em nos
atender, ainda que muito aquém daquilo que a gente precisa e merece.
Isso, por ora, não passou de mero discurso. Foi um anúncio, mas por
enquanto, não tem nada na Assembleia Legislativa de São Paulo, não foi
enviado nenhum projeto, o que está causando um desgaste, uma revolta
muito grande na classe.
Marilda completou, dizendo que a operação deverá ser por tempo indeterminado:
— Penso que, na próxima semana, tenhamos que retornar a Operação
Blecaute por tempo indeterminado, o que significa uma greve até que nós
sejamos atendidos, que o governo nos respeite.
Ela enfatizou que a possibilidade de uma greve geral não está
descartada e que isso dependeria também dos resultados das assembleias
das demais carreiras.
— Estamos em estado de greve e continuamos assim até o momento. O
estado de greve é uma pré-greve. E é o que tentamos evitar de todas as
formas, mas pelo visto, é o governo que quer uma greve.
O presidente do Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado
de São Paulo), George Melão, também cogitou a possibilidade. Ele disse
que a categoria está em “assembleia permanente”.
— Na semana passada, foi deliberado que a assembleia será permanente
até que o projeto seja apresentado à Assembleia [Legislativa] pelo
governador [Geraldo Alckmin], para que a gente possa tomar conhecimento
do teor dessa proposta. Até agora, nós só sabemos o que saiu na
imprensa.
Marilda Aparecida Pansonato fez reclamação semelhante.
— Ninguém teve acesso ao projeto, ninguém viu esse projeto. Procurei de
todas as formas ter acesso e ainda não consegui. Obviamente que a
Associação dos Delegados não vai endossar um projeto do qual não
participou. Queremos participar desse processo, dessa elaboração. Agora,
quando é que ele vem?
Na avaliação dela, o governo está desrespeitando os delegados de “forma acintosa”.
— Não há o que se dizer para uma categoria, para uma instituição toda.
Não há o que se dizer para a Polícia Civil que possa minimizar um
desrespeito como esse.
16 de outubro
De acordo com a presidente da ADPESP, o clima de revolta pode levar a
“uma atitude muito mais drástica”. Ela citou o confronto entre as
polícias Civil e Militar, ocorrido em 2008, nas proximidades do Palácio
dos Bandeirantes. Na ocasião, a categoria estava em greve.
— Temos uma data muito simbólica, que é 16 de outubro. Ela é muito
emblemática, muito forte para a categoria. Cinco anos depois do que
aconteceu de frente ao Palácio dos Bandeirantes, ainda estamos
aguardando uma resposta. Como assim? Como que pode se desrespeitar uma
classe durante tanto tempo dessa forma?
Paralisações
A Operação Blecaute começou a ser deflagrada em 29 de julho. Segundo
Marilda, no primeiro momento, os policiais cruzaram os braços por duas
horas, em um determinado dia da semana. Posteriormente, o tempo de
paralisação aumentou para quatro horas e, finalmente, para seis horas. A
manifestação foi suspensa quando o governo estadual anunciou o
reajuste. Naquela ocasião, de acordo com ela, o nível de adesão já era
de quase 100% no Estado.
Marilda explicou que no caso de uma Operação Blecaute permanente, os
delegados ficariam nos postos de trabalho, mas seriam atendidas apenas
ocorrências emergenciais, selecionadas a critério da autoridade
policial.
— O blecaute é uma operação que, tornando-se permanente por tempo indeterminado, é uma greve.
Carreira jurídica
O anúncio feito pelo governo era muito aguardado pelos delegados porque
também significava a consolidação de uma das principais reivindicações
da categoria: a carreira jurídica, reconhecida pela Assembleia
Legislativa de São Paulo em 2012, por meio da Emenda Constitucional nº
35, conforme destacou Marilda.
— A grande conquista para os delegados de polícia seria essa condição
de sedimentar nossa carreira jurídica. De que forma? Nos tratando de
maneira diferenciada. Não queremos aumento maior do que ninguém, não
queremos equiparação com ninguém, não queremos isonomia com ninguém, não
queremos salário de promotor, de juiz. Só queremos um tratamento tão
respeitoso e com tanto reconhecimento quanto o das demais carreiras
jurídicas.
George Melão enfatizou que as exigências para o concurso de delegado de
polícia são equivalentes aos dos concursos para magistratura,
Ministério Público, Defensoria Pública e Procuradoria.
— Eu costumo a dizer que o delegado de polícia tem que receber um
salário de acordo com as suas atribuições constitucionais legais, o que
pode ser menos, igual ou maior do que o de juiz e o de promotor. As suas
exigência para os concursos são semelhantes, porém, para o cargo, as
exigências para delegado de polícia são muito maiores, além do fato de
colocar a vida em risco, coisa que as outras carreiras jurídicas não
fazem.
Outro lado
O R7 procurou a assessoria do governo do Estado, que
se limitou a reiterar as informações divulgadas na ocasião em que foi
feito o anúncio das medidas para valorizar carreiras policiais. A
criação de gratificação da carreira dos delegados de polícia, segundo o
governo, será concedida em duas etapas, de 10,5% neste ano e de 15% em
2014.
Na ocasião, o governador ainda anunciou reajustes nos salários de
investigadores e escrivães da Polícia Civil, que terão vencimentos
equivalentes aos de carreira de nível universitário do Estado. De acordo
com a proposta, o reajuste está previsto em duas etapas, variando de
8,5% a 18,6% neste ano - incluídos os 7% anunciados, no início do mês, a
todas as carreiras policiais e agentes penitenciários - e de 15% a
25,7% em 2014, conforme a classe na qual se encontra.