Estado fez acordo com PCC para cessar ataques de 2006, mostra depoimento
Em São Paulo
- Rogerio Cassimiro - 8.jun.2006/FolhapressO líder do PCC, o Marcola
Depoimento obtido com exclusividade pelo jornal "O Estado de S. Paulo"
mostra que representantes da cúpula do governo estadual fizeram um
acordo com o chefe do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marco Willians
Herbas Camacho, o Marcola, para pôr fim à onda de ataques da facção
criminosa, em maio de 2006. A reunião foi feita dentro do presídio de
segurança máxima de Presidente Bernardes.
A declaração, do
delegado José Luiz Ramos Cavalcanti, foi dada durante depoimento em
processo judicial que investigou advogadas supostamente ligadas ao crime
organizado. Ele foi um dos escolhidos pelo governo para participar do
encontro em 2006. Apesar de essa possibilidade ter sido divulgada na
época dos atentados, o governo do Estado sempre negou o acordo com o PCC
e admitiu apenas que a conversa com Marcola foi uma condição para a
rendição da facção.
A proposta do crime organizado foi levada
pela advogada Iracema Vasciaveo, então presidente da ONG Nova Ordem, que
defendia o direito dos presos e, na época, representava o PCC: se os
responsáveis pelo comando dos atentados nas ruas fossem informados de
que Marcola estava bem fisicamente, que não havia sido torturado por
policiais e que os presos amotinados não seriam agredidos pela Polícia
Militar, os ataques seriam encerrados.
O recado deveria ser dado pelo próprio chefe do PCC. O papel de Iracema era convencer Marcola a aceitar a ideia.
A cúpula das secretarias de Segurança Pública e da Administração
Penitenciária, cujos chefes na época eram Saulo de Castro Abreu Filho e
Nagashi Furukawa, respectivamente, aceitou a ideia da advogada. O então
governador, Claudio Lembo, autorizou o encontro.
Missão
No depoimento, que está no processo criminal 1352/06, Cavalcanti conta
que recebeu uma ligação em 14 de maio, dois dias depois do início dos
ataques, do seu chefe Emílio Françolim - diretor do Departamento de
Narcóticos, o Denarc -, convocando-o para a viagem. Na ocasião, dezenas
de policiais já haviam sido mortos em atentados.
A missão do
delegado era acompanhar a advogada Iracema Vasciaveo até o presídio de
Presidente Bernardes. Os dois e mais o corregedor da Secretaria da
Administração Penitenciária, Antonio Ruiz Lopes, foram no avião da PM
até Presidente Prudente, onde se encontraram com o comandante da região,
coronel Ailton Brandão, e seguiram para o presídio.
Cavalcanti
contou que Ruiz Lopes e o diretor do Presídio de Presidente Bernardes,
Luciano Orlando, autorizaram que a advogada entrasse com celulares.
Todos ficaram em uma sala e Marcola foi levado por um agente
penitenciário. Iracema então se apresentou e começou a conversar com o
chefe do PCC. Inicialmente, ela tentou convencê-lo a falar ao celular
com outro criminoso, que comandava os ataques - o homem nunca foi
identificado pela polícia.
Marcola se recusou. Ele teria
lamentado a morte tanto de policiais quanto de bandidos. A advogada
insistiu e, finalmente, o chefe do PCC aceitou a proposta. Como não fala
ao celular, ele pediu para chamar o preso Luis Henrique Fernandes, o
LH, que é de sua confiança.
Segundo Cavalcanti, "LH foi trazido
para a sala e Marcola disse que ele poderia falar ao telefone e dar a
mensagem da advogada; LH concordou, e a advogada entregou o seu
telefone, que já tinha um número previamente gravado na memória, para
onde LH ligou e conversou com uma pessoa desconhecida".
O
delegado negou a proposta de qualquer acordo, mas disse que Marcola
pediu que a polícia respeitasse o direito dos presos, o que lhe foi
garantido pelo comando da PM. Cavalcanti ainda relatou que "supõe que o
bloqueador de celular tenha sido desligado", pois LH fez algumas
tentativas antes de completar a ligação. Por fim, declarou que "no fim
daquele dia e no dia seguinte os ataques definitivamente pararam". O
policial não quis dar entrevista, mas confirmou as declarações.
Celulares
A advogada Iracema Vasciaveo confirmou os fatos narrados por
Cavalcanti. Segundo ela, a situação estava "fora de controle". Ela
contou que, quando recebeu a proposta dos bandidos, levou ao
conhecimento de colegas na Polícia Civil.
"Naquele domingo (14
de maio de 2006), recebi um telefonema com uma ordem: que eu fosse para o
Campo de Marte, porque de lá seguiria para Presidente Bernardes." Lá, a
advogada afirma que recebeu de um policial os celulares usados no
presídio.
Ela também rejeita a palavra "acordo". Segundo
Iracema, "havia uma chance para encerrar os ataques, e tudo foi feito
para que isso fosse possível". As informações são do jornal "O Estado de
S. Paulo".
Acessado e disponível na Internet em 27/07/2015 no endereço -
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2015/07/27/estado-fez-acordo-com-pcc-para-cessar-ataques-de-2006-mostra-depoimento.htm