MENSAGEM

"Eu não recearia muito as más leis se elas fossem aplicadas por bons juízes. Não há texto de lei que não deixe campo à interpretação. A lei é morta. O magistrado vivo. É uma grande vantagem que ele tem sobre ela" - Anatole France

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Análise da alta criminalidade com letalidade

 
25/09/2013 - 03h01

Análise: Bico e salário baixo contribuem para ação de PMs na folga

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GUARACY MINGARDI
ESPECIAL PARA A FOLHA
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Policiais de folga em tiroteios não são novidade. Um dos motivos é que a maioria atua como segurança privada no horário em que deveria descansar. Outro são os baixos salários, que os obrigam a morar em locais inseguros.
E qualquer PM que seja reconhecido como tal pelos vizinhos corre o risco de virar o xerife do bairro, o que é ruim para ele e a corporação.
A participação de policiais em mortes e tiroteios é coisa do dia a dia no país. O número de pessoas mortas por policiais em serviço, só em São Paulo, é bem maior do que a totalidade de ocorrências do mesmo tipo em todo os EUA.
É difícil dizer que a culpa é só da cultura brasileira, que seria muito violenta. Afinal, há muitos países violentos, a começar pelos EUA, mas na maioria a polícia mata menos.
Provavelmente, a maior parte da culpa tem a ver com o regime militar de 1964 a 1985, quando houve intensa militarização da polícia, não só no nome, mas no espírito.
Foi quando se criou a geração dos "tenentes bandideiros" em São Paulo. A maioria ingressou no final dos anos 1960 e início dos 1970 e lhe foi passada pelos generais uma filosofia simples: vagabundo bom é vagabundo morto!
E transformar essa mentalidade demora pelo menos uma geração. Enquanto isso, os policiais matam e morrem além do necessário. 

GUARACY MINGARDI é analista criminal e ex-diretor da Secretaria Nacional de Segurança Pública 

Acessado e disponível na Internet em 25/09/2013 no endereço -
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/09/1346984-analise-militarizacao-bicos-e-salarios-baixos-contribuem-para-as-ocorrencias.shtml

CONCLUSÃO: 

     O penúltimo parágrafo da análise do Guaracy retrata o cerne do momento crucial vivido na área de Segurança Pública no Brasil. Particularmente em São Paulo, com os sucessivos erros cometidos na política de segurança pública do Estado, que nos últimos anos implantou a doutrina do confronto letal pela polícia militar, o resultado não poderia ser outro. O ano de 2012 registrou o alarmante índice de mais de uma centena de policiais militares mortos na guerra declarada do crime organizado, que não aceita mais as chacinas promovidas por policiais militares. Urge que se mude a doutrina da segurança pública, com o imprescindível investimento na Polícia Civil, a fim de que esta possa executar seu papel fundamental na investigação necessária para o desmantelamento das organizações criminosas, que propiciará ao Ministério Público condições de oferecer uma denúncia robustecida de provas para a cabal condenação de criminosos. 
     As estatísticas de prisões efetuadas pela polícia militar são um tremendo engodo. A verdade é que as prisões de viciados que promovem a venda de drogas nas chamadas "biqueiras", a fim de sustentar seu vício, não constituem na realidade nenhum golpe no tráfico de drogas. Mal acabam de deter um destes viciados e já tem pelo menos uma dezena de candidatos para assumir seu lugar. O verdadeiro combate ao tráfico se faz com a investigação das organizações criminosas, estabelecendo seu organograma de comando, membros e atuação destes, com a identificação das rotas e locais de distribuição, além da necessária identificação e desmantelamento do suporte financeiro. Isso se faz com uma política de investigação com inteligência policial, ou seja com uma Polícia Civil estruturada, fortalecida e atuante.
     As ações militares devem ser restritas quando houver embates, como grandes operações, sempre subsidiadas por investigação eficaz promovida pela Polícia Civil
   Finalmente, há de se observar um aumento vertiginoso nos crimes contra o patrimônio, principalmente os roubos, onde têm ocorrido um índice alarmante de mortes de vítimas, que na grande maioria se quer reagem. A causa é uma só. O policiamento ostensivo da polícia militar tem se demonstrado pífio no combate dos crimes de oportunidade. A questão é mais de falta de gerenciamento da polícia militar, do que propriamente de falta de efetivo. A verdade é que a polícia militar tem um grande efetivo de oficiais e praças que não estão empregados na atividade fim, isso quando não se põem a promover investigações desastrosas, com resultado de mortes, como tem ocorrido nos últimos anos, vide operação castelinho e operações da rota em assaltos a empresas e supermercados, subsidiadas por levantamentos do P2 da corporação.
A sociedade tem que acordar e exigir de seus políticos uma mudança na política de segurança pública do pais. A sociedade é civil e não suporta mais uma polícia militarizada e adestrada somente para o embate. Os tempos são outros e a polícia deve respeitar a lei e agir com inteligência. Os resquícios da ditadura militar devem ser verdadeiramente banidos de sociedade brasileira.